O presidente do Comitê de Transação Tributária da Associação Brasileira da Advocacia Tributária (ABAT), Eduardo Natal, questiona a ideia disseminada pelo governo, segundo a qual a União teria sido vitoriosa no julgamento do STJ (Superior Tribunal de Justiça) sobre benefícios fiscais ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Na opinião do advogado tributarista, a decisão da Justiça foi boa para as empresas, especialmente porque o acórdão do Tribunal segue o que diz a Lei e não distingue custeios e investimentos. Segundo ele, a Receita Federal não pode criar mais requisitos e exigências para isenção de tributações do que aquilo que já está definido pela própria Legislação.
De acordo com o representante da ABAT, a discussão ainda não está encerrada e pode gerar uma nova onda de contencioso: “O risco de autuação já existia, mas o ônus da prova, como bem preceitua o Código Tributário Nacional, deve ser apurado e apontado pelo Fisco, no caso dos incentivos que demonstrem a sua não destinação aos empreendimentos econômicos desenvolvidos pelas empresas”, explicou o especialista.
Entenda
Em abril, o STJ decidiu não ser possível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, dentre outros – da base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), salvo quando atendidos alguns requisitos previstos em Lei.
O julgamento foi considerado uma vitória pela União, que enxergou a possibilidade de autuar, ou de questionar os descontos na base de cálculo do IRPJ e CSLL dos valores de benefícios fiscais de ICMS concedidos pelos estados e o Distrito Federal.
Contraponto
Entretanto, para o advogado Eduardo Natal, a decisão não representa propriamente uma vitória jurídica do governo. “O que o STJ fixou foi a observância dos preceitos e requisitos da lei em vigor, sendo certo que a Receita Federal, historicamente, sempre procurou introduzir novos e mais complexos requisitos por meio de instruções normativas e de respostas de consultas fiscais”, justificou.
“O que não pode é a Receita Federal criar mais requisitos do que a própria legislação definiu – até porque é uma matéria de reserva absoluta de lei”, esclareceu. “Portanto, a Receita Federal, que exigia uma série de outros requisitos, como concomitância entre o valor recebido e a demonstração de que aquele valor foi para um determinado específico fim, isso não está na lei. A empresa tem liberdade de dispor isso, desde que seja para o seu objetivo social”, afirmou.
“Além de vários outros preceitos ali, criados pela Receita, que não podem fazer parte – que aliás, agora foram sacramentados por essa decisão do STJ”, observou o tributarista.
Subvenções
Eduardo Natal destacou ainda que um dos divisores de água da discussão está no entendimento da Receita de que, mesmo após a edição da Lei Complementar nº 160/2017, há distinção entre subvenções de custeio e subvenções para investimento, e que somente as últimas poderiam escapar da tributação, mesmo após a edição da Lei Complementar nº 160/2017.
“Ocorre que a referida Lei suprimiu essa distinção, prevendo que os incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos concedidos pelos estados e pelo distrito federal são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstas”.
Esclarecimento
Na avaliação do especialista, a despeito do que vem sendo divulgado, de que o STJ teria realizado a distinção entre subvenções para custeio e subvenções para investimento, e que o Fisco teria liberdade para fiscalização e, principalmente, autuação dos valores descontados do lucro real em relação a todos os contribuintes, sem qualquer distinção, isso não ocorreu.
“Em princípio, para fins de não computação ao lucro real, os incentivos ou benefícios fiscais ou financeiro-fiscais de ICMS são subvenção para investimento e todos os valores a eles atrelados podem esquivar-se de tributação (IRPJ e CSLL), se preenchidos os requisitos legais”, lembrou, acrescentando que “isso significa que o Fisco poderá autuar eventuais descontos cujos valores se destinem para fins alheios ao desenvolvimento do empreendimento econômico” – o que remete à necessidade de aplicação em atividades operacionais das empresas beneficiadas.
Autuação
Segundo Natal, a hipótese de autuação fiscal dos descontos deve ser aplicada em caráter subsidiário, apenas nos casos em que se comprove desvio de finalidade. “Embora não tenha sido uma vitória total dos contribuintes, não se pode afastar a premissa de que inexiste, para fins de não computação dos incentivos e benefícios de ICMS no Lucro Real, distinção entre subvenções para custeio e investimento”, justificou.
“Sendo assim, para fins de possibilidade de descontos dos respectivos valores, considera-se que o recente acórdão do STJ é uma boa decisão, desde que respeitados os requisitos dispostos pelo art. 30 da Lei nº 12.973/14”, esclareceu o especialista. Para ele, a discussão ainda não está encerrada e pode gerar uma nova onda de contencioso: “O risco de autuação já existia, mas o ônus da prova, como bem preceitua o Código Tributário Nacional, deve ser apurado e apontado pelo Fisco, no caso dos incentivos que demonstrem a sua não destinação aos empreendimentos econômicos desenvolvidos pelas empresas”, concluiu.
Fonte: Brasil61